Só mais um dia na Malhação
Agorinha, bem na hora do almoço, eu decidi ir até a academia pagar uns polichinelos. Gente compromissada é assim: reclama, reclama, mas vai. Com aquela boa vontade que só Deus explica. Ou nem ele.
Munido de toda a força que eu nem tenho, subi a penosa ladeira da Travessa Dom João VI rumo à penitência.
Aposto que o próprio Dom João VI não subiria isso aqui. Nem em ano de eleição.
- Pô, Sr. Rei. Vossa excelência precisa dar um pulinho lá na Cidade Ademar. Pessoal lá fez uma rua só pra você.
No dia, rua cheia de criança, político comendo pastel, aquela pataquada toda.
Dom João chega sentado na liteira. Agradece os convidados e diz: "Se é para o bem do povo e felicidade geral da nação, diga ao povo que não subo essa ladeira mas nem fu****o". Mal sabia ele que no alto da ladeira tem o Master Carnes, mas isso já foi assunto de outro post.
Acho que misturei os reis. Dom João VI foi aquele que saiu da vida pra entrar na história, não foi? Ou aquele que tinha aquilo roxo?
É muito bagunçada essa tal de história.
Voltando ao foco. Põe na tela, comandante Hamilton!!
Reunindo forças pra subir a ladeira, vi o carro parado na frente da casa. Logo pensei numa boa desculpa pra subir a rua e dirigir menos de 30 metros sem me achar um vagabundo sem valor. Afinal, em algum momento teria que entrar no carro e manobrar pra guardar na garagem, certo? Seria apenas uma manobra um pouco maior.
Assim sendo, adentrei o cockpit e bora pra panobianco.
Chegando lá, passa catraca, álcool gel até no céu da boca e violá! Uma bicicleta muito concorrida estava vazia. Tomei-a, antes que aventureiros lançassem mão dela.
Olhei pra tela do celular e enxerguei tudo. Seria normal, se isso não significasse que eu esqueci e saí de casa com o óculos de leitura. O que faz reduzir consideravelmente o meu campo de visão.
Estava eu pedalando rumo a Passárgada, onde sou amigo do Rei, quando vejo caminhando em minha direção um cara negro, de roupa preta, carregando uma coisa enorme.
O meu primeiro pensamento foi - todo mundo tem um primeiro pensamento, aquele que vem antes de raciocinar. E o meu é sempre idiota:
"Mas porque diabos esse cara tá carregando um piano dentro da academia?".
Não era um piano. Era ele mesmo. O cara.
Tipo assim, o negão de preto tava carregando ele mesmo. O que parecia um cara negro de roupa preta carregando uma coisa enorme era um cara negro de roupa preta. Ponto. Enorme.
Olhei pro braço dele e pro meu. Não dá pra comparar. Então olhei pro braço dele e pra minha coxa. Também não deu pra comparar. Lembrei que eu preciso comer mais proteína antes de subir pra academia. Antes ou depois? Vai ver é por isso que eu continuo parecendo um pernilongo. Pipoca é proteína?
Melhor voltar pro facebook pedalante rumo ao infinito e além sem sair do lugar.
Bicileta pedalando parado enche muito o saco. Bora fazer alguma coisa mais hardcore.
Cheguei na área dos aparelhos e tava bem vazio. Isso é legal. Não tem coisa mais chata do que sofrer com alguém do lado perguntando: já sofreu? quero sofrer também.
Tem coisa mais chata sim. A bicicleta parada.
Daqui pra frente você vai me desculpar, mas eu nunca decorei o nome de nenhum dos aparelhos. Aparelho de academia tem nome de biscoito de vó. É rosca disso, rosca invertida daquilo. Minha vó fazia umas roscas maneiraças. Nenhum daqueles bombadões sobe o que é comer uma rosca. Entenda como quiser.
Aparelho que não tem nome de biscoito tem nome de supino. Nessa grande confeitaria onde os docinhos somos nós, e eu ainda sou um bolo véio de fubá, o supino deve ser tipo um creme inglês, só que feito num lugar exótico. Ué, maionese não virou Aligô?
Essa coisa de nomes e sons me lembrou de uma coisa que eu vi ontem na TV. O William Bonner, entre uma Itaipava e outra, dizia que os presidentes daqui e dali estavam mandando mensagens parabenizando o Lula, aquela coisa toda.
Aí o pessoal da produção, muito solícito, mostrava o tweet traduzido. O conteúdo, mas não o nome do infeliz.
Tudo normal, até que chegou o tweet do presidente da Ucrânia. O pessoal da arte traduziu a mensagem do inglês pro português. Mas não traduziu (como corretamente deve ser feito), o nome do rementente. William Bonner dizia que o presidente Volodymyr Zelenskyy disse que bla bla bla, enquanto na tela aparecia o nome "Володимир Олександрович Зеленський". Quem foi o fila das quenga que disse que isso aí significa Volodymyr Zelensky? Baseado em que?
Tentei não rir. Momento solene e tal. Mas se até o Bonner já tava com o pé na cana, porque me privar de boas risadas no silêncio da noite?
Volta pra academia.
Lembrei que no futebol de terça passada, minhas coxas entraram em combustão nos primeiros minutos de jogo e talvez seria legal fazer um pouco de perna pra tentar fortalecer hoje a coxa que tem que ficar forte pra amanhã. Havia uma moça saindo do aparelho, eu agradeci e sentei.
Pensei: "Sou mais forte que ela, melhor verificar o peso. Acho que vou usar uns 40kg, coitada da moça".
Quando abaixei pra conferir, a moça estava fazendo o exercício de coxas com 60kg.
Meu Deus, moça!! Ce tá querendo virar o que? Um peru de Natal?
Imbuí-me da missão de exercitar com os mesmos 60kg.
Levantei do aparelho em menos de 2 minutos. Sem mais detalhes.
Vamos pro próximo.
Tem um aparelho que eu chamo de "isso não é coisa de Deus". É mais ou menos assim: você fica sentado num banco, puxa uma parada pesada de cima e ao mesmo tempo empurra outra parada com as coxas. Deu pra entender? É assim, num momento vc tá esticado como uma sardinha, e no outro tá em posição fetal.
Feto => sardinha => feto => sardinha
Dói tudo, sobretudo o abdomen, onde eu tenho um rasgo de 40cm graças ao meu transplante. Então eu PRECISO passar pelo INECDD (Isso Não É Coisa De Deus) pra refazer tudo o que o Dr. Raoni cortou com o bisturi.
Dr. Raoni é um menino. Novinho, bonzinho, inteligente que chega a feder neurônio. Mas é um fiapo. Ele me colocou no INECDD, mas ele mesmo não aguenta um segundo no INECDD.
Só que o problema hoje nem foi o INECDD, mas o aparelho do lado.
Tinha um cara no aparelho do lado. Perguntei se ele iria no INECDD, ele disse que ficaria no Cara no Bolo. Ele não sabe, mas estava fazendo Cara no Bolo. Vou te explicar:
O aparelho tem uma plataforma que vc prende a batata da perna e fica em pé. Meio que naquela posição do Michael Jackon, que parece que ele vai cair pra frente, mas não cai.
Aí o cidadão cruza os dois braços à frente num afetuoso abraço em si mesmo e abaixa e sobe a parte superior do corpo. Imagina que se colocarmos uma mesa com um bolo de aniversário de criança na frente dele, o que vai acontecer? Ele vai mergulhar a Cara no Bolo, levantar, dar uma lambidinha e mergulhar a cara no bolo de novo.
Chantilly ajudando a rapaziada a ficar com o abdomen trincado. Sou um gênio do marketing :-)
O que lascou tudo é que eu dei esse nome pra esse aparelho hoje. Na hora que o cara tava lá. Na hora que ele abaixou e olhou pra mim, e eu JURO QUE VI a cara dele toda branca, o olhinho piscando no meio dquele chantilly todo... e ri alto.
Carinha da academia, se você um dia ler isso, por favor. Me desculpa. Não é nada com você.
Não deu pra fazer o INECDD. Fiquei com vergonha, ele também.
Hora de ir embora da academia. Acabou por hoje. Daniel paspalhão tornou o ambiente mentalmente insalubre.
Desci alegremente a Travessa Dom João VI e sentei-me, desfalecido no sofá.
Foi quando senti a chave do carro no bolso.
O pior preguiçoso de todos é aquele que vai de carro até a rua de cima pra depois ter que subir tudo de novo a pé pra buscar o carro que esqueceu na rua de cima.
Só mais um dia de malhação na Cidade Ademar.
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